terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Mesinha do terrace do Grande Hotel de Belém

É uma tese que se sustenta, até ao se olhar uma foto antiga do demolido hotel de Belém. Até hoje ,o povo da cidade lastima sua destruição e os motivos certamente são secretos.


Este pé de mesa que consegui com um carroceiro pelas ruas, é assinada por E.W. Paris, é em ferro fundido com aplicação de uma outra peça em ferro batido que sustenta o tampo, que não possuo e afixada por parafusos.









segunda-feira, 7 de setembro de 2015

Durvalina Vasconcelos Paiva

 Nesta imagem minha mãe deveria ter entre 23 e 24 anos.


Nascida Durvalina Marçal de Vasconcelos, logo cedo perdeu  sua mãe e foi entregue ao tio Manoel Marçal para ser criada no município de Cametá, onde servia a família como uma espécie de empregada e pelo que me contava sofreu muita humilhação deste tio.
Na esquerda Dulcinéia Marçal de Vasconcelos e sua irmã Durvalina Vasconcelos Paiva, passeando pelas ruas do comércio de Belém do Pará.

Voltou à Belém e em uma exibição de uma peça de Pastorinha da qual fazia parte, no Teatro da Paz, conheceu meu pai Claudio Romanoli Paiva.

Imagem do casamento de minha tia Maria Clara, onde meus pais aparecem.

 Os primeiros anos de casamento foram extremamente difíceis em termos financeiros, porém ela com dons artísticos, pintava além de telas, almofadas para casamentos e era exímia costureira. Sua produção de batas para recém nascidos com "casas de abelhas" era toda entregue à comerciantes e não havia estoque tal seu trabalho, todas as noites a via na máquina de costura.

 Durvalina Vasconcelos Paiva e José Maria Vasconcelos Paiva, creio que em 1952 ou 1953, pois nasci em 1950.


Era católica devota da Senhora da Conceição, cuja primeira igreja contou com sua ajuda e de toda a coletividade do bairro, através de doações de pedras, porém, algo a incomodava profundamente, sua mediunidade e as frequentes, incorporações de entidades que não aceitava.

Meus pais Durvalina Vasconcelos Paiva e Cláudio Romanoli Paiva no dia de seu casamento.

Nasceu em 04 de junho de 1930 e veio a falecer em 10 de maio de 1967, de um câncer proveniente talvez de uma operação de apêndice, sabe lá se bem feita. Era uma bela morena de cabelos negros e muito vaidosa, rígida as vezes, porém chegou a abrigar em sua casa muitas pessoas necessitadas, como Dona Marcolina e sua filha excepcional a Maroquinha, chegou a criar além dos quatro filhos uma filha de criação chamada de Lucila, porém esta deu-lhe o maior dos desgostos, traindo-a de modo muito cruel, não sei que fim levou esta criatura diabólica.


 Minha mãe pouco tempo antes de nos deixar.

No agravamento de sua doença, recorria muito a Senhora do Perpétua Socorro, íamos as novenas das terças-feiras e tentava vários chás de ervas que lhe ensinavam, porém jamais contou aos filhos de suas dores. Seu falecimento foi para nós um fato de extrema surpresa, pois nada sabíamos.

Faço este registro, pois nada ainda tinha publicado sobre minha mãe amada. Dona Durvalina teve quatro filhos, José maria Vasconcelos Paiva, Jorge Vasconcelos Paiva, Maria Helena Vasconcelos Paiva e Jaime Vasconcelos Paiva.


quinta-feira, 9 de julho de 2015

ANTIGUIDADES EM UMA CASA DO BAIRRO DA CIDADE VELHA. Jornal dos Bairros, encarte de o Liberal/ 2/ago/1989




A PAIXÃO POR MÓVEIS ANTIGOS
As histórias dos colecionadores são surpreendentes, engraçadas e até mesmo casuais, como o próprio destino. As primeiras peças adquiridas nunca se esquece. Com o passar do tempo, elas se tornam objetos-chave das coleções. O colecionador de móveis e outros objetos antigos, José Paiva, 39 anos, residente na Rua Cesário Alvim, 841, no bairro da Cidade Velha, ganhou de presente de aniversário a primeira peça de sua coleção – uma garrafa de vinho de Alcobaça, uma vila de Portugal – quando tinha 16 anos. Segundo ele conta, na década de 70, em Belém, os leilões eram realmente realizados nas residências de famílias tradicionais e as peças em sua maioria de origem europeia, eram adquiridas durante as viagens que as pessoas faziam aos países daquele continente.
Nos Palacetes Pinho e Bolonha, era comum a realização de leilões, quando o martelo anunciava as grandes compras, conforme informa Paiva. Alguns leiloeiros fizeram nome, nesse período, como é o caso do Raimundo Campos e Benjamim Cardoso (ambos falecidos). Surgiram desse comércio as peças que, juntamente com a garrafa de vinho de Paiva, foram compor sua coleção: enfeites de parede em porcelana também originários de Alcobaça. Os primeiros móveis foram adquiridos da loja de Renê e Agência Neves – outros pontos de concentração dos colecionadores de época -, a última localizada bem em frente à antiga Escola de Engenharia, na Rua Manoel Barata. José Paiva conta que era uma portinha onde se encontrava um número considerável de móveis entulhados. As antiguidades e antiquários, que hoje mantém um certo status,  tinham naquele tempo a denominação de “velharia”. Seus preços eram acessíveis e as coleções valiosas.


Peças raras
As pessoas não acreditavam na valorização de seus objetos com o passar do tempo, explicou Paiva. Ele adquiriu móveis do século XVII, em estilo colonial português, os chamados “tremidos e torcidos”, fabricados manualmente “Não existiam tornos e as pessoas fabricavam com as próprias mãos esses móveis”, informou. Na ante sala, ele conserva um conjunto de sala de jantar completo, bem como na sala, uma cômoda que combina com a chapeleira e uma mesinha, todos em madeira escura e mármore. No quarto de dormir o estilo se repete na cama e nos dois guarda roupas. De início Paiva teve de enfrentar a relutância da família que não queria em casa a chamada “velharia”. Com o tempo, seus irmãos também tornaram-se colecionadores.
Apesar de Paiva não saber o número de peças que conserva hoje em sua coleção, não hesita em dizer que são de grande valor. Nada porém se compara à gratificação de quem consegue uma grande coleção, seja do que for. Para José Paiva, é necessário o conhecimento de estilos e ainda da história das civilizações que produziram as peças. Tudo isso sem dissociar os valores estéticos, da harmonia. Os objetos (móveis, vasos, quadros e outros) devem conforme Paiva, combinar com as demais peças de uma casa. É sempre necessário evitar a compra de copiados. Paiva conta que adquiriu, no início de sua coleção, telas não originais e três ventiladores de teto que não estavam funcionando. Os objetos dificilmente podem ser devolvidos.


Um sonho
O maior sonho deste colecionador de móveis e objetos antigos é montar uma loja de antiguidades e se transformar em leiloeiro. Ele disse que o comércio de leilões em Belém hoje, está inflacionado e que os antiquários já instalados criaram uma espécie de pool. “Nós encontramos de três a quatro peças iguais nos leilões”, reclama. Paiva comprou algumas coleções em São Paulo e no Rio de janeiro. “Na Praça XV (RJ) existe a feira dos pobres e dos ricos, mas as peças, muitas vezes, se repetem nos dois lugares com preços diferentes”, conta.
Entre os colecionadores também existe uma espécie de comércio, mas feito através de troca. Ao adquirir uma peça, é preciso estar atento à cotação do dólar, pois no caso de revenda, o preço das antiguidades são fixados nesta moeda, ensina José Paiva. “É um comércio no qual nunca se perde. Quanto mais antigas as peças, maior valor elas possuem.


Peças vinham de Portugal a Belém
 A vila de Alcobaça, em Portugal, pertence ao distrito de Leiria. Nesse local há um antigo convento que pertenceu aos monges da Ordem Ciste, habitantes de um célebre mosteiro por onde passa um riacho. Considerados os colonizadores da região, os monges ali fabricavam peças de grande valor. As cerâmicas eram feitas próximo ao riacho, em cujas águas, que passavam dentro da propriedade dos monges, as peças de porcelana eram lavadas. Durante um período de escavações, foram encontradas materiais arqueológicos como machados de pedra e objetos de cobre e bronze, entre outros.
No local também existem grutas onde foram encontrados mosaicos e outros objetos também de valor. No local destaca-se o comércio de antiguidades: são móveis oloniais do período barroco português, do século XVII. Foi nessa vila que muitas famílias que residiam em Belém conseguiram coleções de valor inestimável.
Os móveis facbricados manualmente, com elementos decorativos “tremidos e torcidos” (parecidos com os frisos de algumas casas existentes em Belém que datam da colonização), são ali comercializados. As peças de José Paiva, morador do bairro da Cidade Velha, são todas do estilo barroco português.

OBS.: Nem todas as informações publicadas no jornal pelo jornalista refletiam a realidade, como a casa que era de meu pai, os móveis da sala de jantar que não eram meus, nos palacetes Pinho e Bolonha só houve 1 leilão em cada um dos prédios, os móveis não eram fabricados em Alcobaça e sim as cerâmicas e a garrafa não foi a primeira peça da coleção, tudo compreensível numa época onde a informação não tinha todas as facilidades de hoje.



segunda-feira, 6 de julho de 2015

SEU JACÓ (João Amaral Souza)

Todos o conheciam como Seu Jacó, nascido no município de Mojú, Baixo Tocantins,  Pará, em 19 de junho de 1938, tinha como pais Seu João e Dona Maria e desde o dia 11 de novembro de 1981 era registrado no Sindicado dos Músicos, como MÚSICO POPULAR, pai da Rainha da Seresta, Cleide Moraes, um homem extremamente dinâmico, amante da música e também músico. Presto esta homenagem a este amigo que sempre foi um excelente vizinho e amado por todos que o conheciam.

















quarta-feira, 1 de abril de 2015

DULCE ROCQUE, uma homenagem



Lembranças de um passado revolucionário (transcrito do Portal ORM)



Dulce Rosa de Bacelar Rocque, 64 anos, é uma paraense de Belém, que viveu profundamente a agitação política do Brasil na época da ditadura, mais precisamente quando houve o golpe militar que derrubou João Goulart do poder, em 1964. É formada em Ciências Econômicas pela UFPA; em Economia Política pelo Instituto de Ciências Sociais de Moscou; em Economia e Comércio pela Alma Mater Studiorum (Universidade de Bolonha), com especialização em Programação Econômica do Território (Urbino) e em Direito Público (Bolonha). Saiu do Brasil ainda jovem para estudar em Moscou e depois viveu por 35 anos na Itália onde conheceu Carlo Cioni, com quem foi casada e teve uma filha, Anna Marilia Cioni, que hoje mora em Roma. Seu engajamento político permitiu que conhecesse grandes figuras como Luiz Carlos Prestes (líder comunista), Salomão Malina (último Secretário Geral do Partido Comunista Brasileiro) e Gregório Bezerra (legendário líder pernambucano do PCB). Nesta entrevista, a economista aposentada relata sua vivência política e atividades realizadas no período em que viveu na Europa.Por Iva Muniz
Troppo - Quando a senhora despertou para as atividades políticas e sociais no Brasil?
Dulce - Em 1964, quando entrei para a faculdade de Economia. Poucos dias depois do resultado do nosso vestibular, João Goulart dobrou o número de vagas nas faculdades e realizaram outro vestibular para preencherem as novas vagas.
Troppo - Como foi que a senhora exerceu sua atividade política aqui em Belém?
Dulce - O golpe de estado aconteceu no ano que entrei para a faculdade. A situação dentro da UFPa era agitadíssima e eu fiquei empolgada em descobrir que, naquele mundo político, mulher também tinha seu peso. Comecei a ser informada do que sucedia nas reuniões que aconteciam no movimento universitário, até que comecei a ser convidada a participar delas. Na faculdade de Economia o PCB era bastante forte e pessoas do partido se aproximaram de mim. Inicialmente não dei peso aos convites. Depois do golpe fui procurada mais insistentemente para fazer pequenas tarefas, como procurar saber onde estavam determinados companheiros. Como não era conhecida no movimento estudantil, era mais fácil entrar nas prisões a procura deste ou daquele 'preso político', e saber quem mais estava lá. Os ativistas da esquerda tinham desaparecido depois do golpe e ninguém sabia quem estava preso e quem estava escondido, nem em qual prisão estavam.
Troppo - E depois que a situação foi ficando mais calma o que ocorreu com o passar do tempo?
Dulce - Alguns colegas começaram a voltar às aulas. Muitos tinham perdido o emprego. A agitação anterior não existia mais, mas as reuniões, agora clandestinas, continuaram, aliás com mais assiduidade. No segundo semestre de 64 comecei a participar de algumas dessas reuniões. Começaram então a usar a minha casa como 'aparelho' e a nossa Kombi como meio de transporte. Tinha entrado com armas e bagagem no PCB. Todos tinham começado a usar nomes falsos, por isso, de nada vale elencá-los aqui.
Troppo - Como a senhora conheceu Luiz Carlos Prestes, Salomão Malina e Gregório Bezerra?
Dulce - Malina conheci em Belém, quando esteve aqui para uma reunião no dia do Círio, no final da década de 1960. Depois o revi em Moscou e mais tarde o hospedei várias vezes em minha casa na Itália. Gregório chegou em Moscou vindo do México cerca de um mês depois da troca dos presos políticos com o embaixador Elbrick. Isso em outubro/novembro de 1969. Nos víamos diariamente. Quando decidiu escrever um livro sobre sua vida, datilografei os primeiros capítulos. Prestes conheci em Moscou em 1970/71. Poucas vezes apareceu no Instituto onde estudávamos. Fui algumas vezes à sua casa. Maria, sua esposa, era muito simpática com todos e nos deixava à vontade. Com ele, porém, éramos, todos, muito formais. Ouvi-lo falar parecia estar conversando com a Historia. Contava de encontros com Ho Chi Mim, de discussões com Mão Tse Tung, de conversas com Tito e assim por diante. Magro, baixinho, a sua seriedade, sua personalidade, sua presença, me incutia respeito. Quando o revi em Bolonha, anos depois, tive a mesma sensação: o admirava.
Troppo - A senhora saiu do Brasil como exilada política?
Dulce - Não, saí para estudar na França, ou seja, isso foi o que disse a todos os amigos e parentes quando viajei para Moscou. O AI 5 tinha entrado em vigor em dezembro de 1968, a situação de quem era da esquerda tinha se tornado muito difícil, e se dissesse para alguém o rumo da minha viagem, com certeza não conseguiria chegar nem no Entroncamento, muito menos em Moscou. Mas, como consegui viver em Moscou, depois me tornaram uma exilada.
Troppo - Por que a senhora foi para a Itália?
Dulce - Em Moscou conheci um italiano e, depois de dois anos de namoro, resolvemos casar, na Itália, assim conheceria os seus parentes e depois viríamos para o Brasil. Esse era o plano. Porém, não conseguimos voltar dentro do prazo, então comecei a trabalhar denunciando a ditadura no Brasil. Com meu marido fiz um jornalzinho que distribuíamos grátis, com notícias lidas no Le Monde ou outros jornais, raríssimos, que falavam da situação daqui. Passava o dia inteiro procurando noticias em todos os jornais italianos e acabava a jornada sem nada nas mãos. A censura funcionava muito bem no Brasil. Em 1974, quando estava me preparando para voltar, recebi a noticia da prisão de alguns companheiros que tinham estudado comigo em Moscou. Sob tortura, um deles falou e assim a policia brasileira descobriu que ainda tinha alguém daquele grupo de estudantes na Itália. Eu já era membro também do Partido Comunista Italiano e recebi a 'ordem' da direção do PCI de não voltar, pois meu nome já estava em todas as portas de entrada do Brasil. Fiquei furiosa!
Troppo - Na época, como estava a situação política e social da Itália?
Dulce - A Itália fervia politicamente. Não somente greves se realizavam constantemente, mas a luta entre o PCI e a Democracia Cristã, partido católico que a governava desde o fim da 2ª. Guerra, era enorme. Admirava-me o fato de todos discutirem política abertamente em bares, ônibus, praças, em todo canto. Acompanhava meu marido nos comícios que fazia quando foi candidato a deputado pelo PCI e me admirava mais ainda com tanta liberdade. Estava vivendo a Democracia e participando também. O meu problema de consciência por não ter voltado para o Brasil com os outros companheiros me levou a utilizar tudo o que aquela democracia me permitia. Fiquei mais audaz. Comecei a me apresentar em todos os festivais do L’Unitá (jornal do PCI) com uma mesinha e uma carta escrita em várias línguas endereçada aos ministros da ditadura e ao presidente do Brasil. Recolhia assinaturas e o dinheiro para o selo. Por segurança, não as enviava diretamente da cidade onde morava, usava os motoristas da firma de transportes internacionais onde trabalhava para colocá-las no correio em todas as cidades italianas por onde passavam.
Troppo - Como os italianos reagiam a esta sua ação?
Dulce - No primeiro ano que fiz isso recolhi milhares e milhares de assinaturas. Os italianos eram muito solidários e curiosos: todos queriam notícias da situação brasileira, que nem eu. Porém, era muito difícil. Malina me atualizava da situação naquelas vezes que ficava hospedado em casa, rumo a alguma reunião do PCB. Outros companheiros brasileiros que eu hospedava também me contavam algo. Ter notícias pela igreja era mais fácil quando chegava algum documento dos padres brasileiros denunciando fatos graves. Um padre italiano foi expulso do interior do Pará e foi parar em Piacenza. Descobriu-me e, como ele também morria de saudades, começou a freqüentar a minha casa e me contar coisas que aconteciam e que os jornais não falavam. Isso aumentou a minha raiva.
Troppo - O que você fez ?
Dulce - Aumentei as denuncias contra a ditadura. Não tinha mais uma mesinha, mas um estande nos festivais do L’Unitá. Foi num deles, em Milão, que conheci o primeiro brasileiro naquele ambiente de esquerda. O cara apresentou-se como Francisco e demonstrou ter muitas informações sobre o que estava acontecendo no Brasil. Ele disse ter ido para a Itália trabalhar pro (Carlos) Marighella (guerrilheiro brasileiro) e que não tinha podido voltar. Fiquei em contacto com o Francisco e, depois de um ano, ele pediu para entrar no PCB. Começamos a trabalhar juntos contra a ditadura e acabou trazendo outros três do grupo do Marighella para a nossa luta.
Troppo - Nos 35 anos que passou na Itália, o que a senhora realizou de relevante naquele país?
Dulce - Paralelamente ao trabalho político, continuava trabalhando, até que me mudei para Bolonha, menina dos olhos do PCI, centro de difusão de todas as lutas contra o que era considerado reacionário. Encontrei o Prestes, novamente, e ele deu-me forças e razões para ir para lá. Comecei a viajar pela Itália e Europa, organizando e participando de feiras e aproveitando para fazer contactos políticos. Em menos de três anos fui trabalhar num órgão público e tive que me especializar em direito público, pois tinha que escrever as leis do setor ao qual fui designada e, depois de aprovadas, interpreta-las para os 380 municípios da região. Pouco a pouco me tornei uma expert em programação da distribuição de carburante. Era chamada para reuniões no Conselho dos Ministros para falar de petróleo e seus derivados. Participei da discussão e preparação das leis do setor desde 1979 até 2003.
Troppo - Apesar de não ser católica, a senhora realizou a primeira procissão do Círio em terras italianas. Por que tomou essa iniciativa?
Dulce - Estava organizando uma mostra sobre o trabalho de Landi, em Belém, que seria realizada durante o Festival Brasileiro de Bolonha. O local que conseguimos foi um salão enorme situado dentro da Basílica de S.Bartolomeu e S.Gaetano. Durante o evento acabei fazendo amizade com D. Stefano Ottani, cura da igreja. Falei das nossas tradições e do Círio também; resolvi preparar um material em italiano, contando a história do Círio, que ele não conhecia. Nessas alturas, tinha conseguido que um pintor italiano viesse a Belém dar aulas de aquarela e, quando voltou, levou consigo um presente para D. Ottani: era uma imagem de Nossa. Sra. de Nazaré. O padre se emocionou e daí nasceu a idéia de organizar um Círio em Bolonha no Festival Brasileiro. Ano retrasado inauguraram um altar para aquela santinha. Agora ela tem um lugar de honra na cidade que concentrou o maior numero de comunistas da Itália.
Troppo - Quando decidiu voltar ao Pará?
Dulce - Os exilados começaram a voltar em 1979 e eu tentei também fazer o mesmo. Morria de saudades e continuava a esperar uma brecha para voltar definitivamente. Depois de dez anos sem vir ao Brasil, decidi que era hora de tentar. Já estava separada de meu marido e minha filha tinha sete anos: nada mais me ligava àquela terra. Quando fui preparar o passaporte me deparei com a 'pátria podestá' e descobri que a filha que eu criava era do pai, ou seja, eu não tinha poderes sobre ela. Explicaram-me que, para a lei italiana, os filhos são dos pais, não das mães. Achei que era uma lei reacionária e retrograda, mas tive que aceitá-la. Cheguei ao Brasil e me informei sobre as possibilidades de trabalho. Veio a segunda decepção: tinha que começar do zero. Tudo o que tinha estudado não tinha valor aqui. Voltei para a Itália e fiquei lá até me aposentar em 2005.
Troppo - Como foi o reencontro com a terra natal?
Dulce - Depois de tanto tempo fora, trinta dos quais na cidade mais organizada da Itália, está sendo duro me acostumar. Para uma pessoa que passou muito tempo 'obrigando' os outros a respeitarem as leis, é duro ver o quanto todos as ignoram aqui. O Código de Trânsito, nem se fala; o Código de Posturas do Município, para mim, foi ab-rogado por falta de uso. Mas temos coisas boas também, principalmente a simpatia do nosso povo. Isso não tem confronto.
Troppo - Em relação ao passado, o que a senhora encontrou de bom e de ruim no Brasil, e mais especificamente no Pará?
Dulce - De bom, que quando saí tinha uma ditadura e agora não tem mais. O carimbó era relegado a ser tocado somente no Bosque Rodrigues Alves e talvez no (bairro) da Condor e agora entrou para os salões da alta sociedade. Notei que aumenta o número de pessoas interessadas a defender e divulgar a nossa cultura, e isso me deixa muito feliz, mas ainda há muito trabalho pela frente. Um deles é ajudar os autores das nossas músicas que, como Verequete, estão na miséria. De ruim, o nível do ensino baixou terrivelmente; a insegurança aumentou de forma inaudita, enquanto o número de policias ficou estagnado. Querem mais? Olhem as calçadas, que desastre; e quando chove, até os bairros nobres alagam. Cadê o nome das ruas? Como descobrir, guiando um carro, qual é a mão das estradas? E as crianças fora da escola? Chega!
Troppo - Quais sua atividades atuais em Belém?
Dulce - Faço trabalhos manuais tipo artesanato para ocupar o tempo livre que a Associação Cidade Velha-Cidade Viva, me deixa. Sou presidente da CiVViva e o meu maior trabalho nela é escrever cartas para os órgãos públicos pedindo o respeito às leis.


terça-feira, 17 de março de 2015

PRÊMIO CARLOS ROCQUE 2014


Tive a honra de ser um dos três homenageados com este prêmio em Belém do Pará, outorgado pela Associação Cidade Velha Viva e pelo Laboratório de Democracia Urbana em parceria com a Prefeitura Municipal de Belém. Uma premiação que me transborda de orgulho e no meu caso, foi uma constatação do amor ao bairro da Cidade Velha, onde nasci, me criei e vivo.